Nota: o presente artigo não traz uma revisão completa dos aspectos da legislação associados aos estudos de ruptura hipotética de barragens, que seria muito extensa para ser abordada em um único artigo. Além disso, existem legislações específicas para barragens com outras finalidades (armazenamento de água e geração de energia, por exemplo), e em alguns casos específicas para um determinado estado.

A Política Nacional de Segurança de Barragens

A Política Nacional de Segurança de Barragens foi estabelecida pela lei nº 12.334/2010 já motivada por eventos de ruptura de barragens que aconteceram no Brasil (ex: Barragem da Pampulha (1954), Orós (1960), UHE Euclides da Cunha (1977), UHE Limoeiro (1977), Cataguases (2003) e Miraí (2007)).

Apesar de um marco inicial fundamental para o aumento da segurança das barragens, a Lei 12.334 não era em si suficiente para promover todos os parâmetros necessários para a sua completa aplicação. A partir dessa lei, por exemplo, deu-se início a uma série de novas legislações, uma vez que foram definidos os órgãos fiscalizadores de barragens específicas, tendo sido estabelecidas, por exemplo, para barragens de mineração, que “a fiscalização da segurança de barragens caberá à entidade que regula e fiscaliza as atividades minerárias, para fins de disposição de rejeitos” (texto já atualizado conforme a Lei nº 14.066/2020).

Na Lei 12.334/2010 foi estabelecido como instrumento da Política Nacional de Segurança de Barragens o “Plano de Segurança de Barragens, incluído o PAE”. O PAE (Plano de Ações Emergenciais) é o documento que estabelece as ações a serem executadas pelo empreendedor da barragem em situação de emergência, mas também com outras atribuições.

Foi definido que diversos parâmetros deveriam ser especificados e normatizados por parte das entidades fiscalizadoras, entre os quais estão a classificação das barragens (por categoria de risco, dano potencial associado e pelo seu volume), o conteúdo mínimo dos Planos de Segurança, a periodicidade e detalhamento das inspeções periódicas e a definição sobre a exigência ou não do PAE, sendo ele inicialmente obrigatório para barragem com dano potencial associado alto.

[Obs.: algumas dessas definições foram alteradas posteriormente, como será abordado mais adiante.]

Legislação Específica para Barragens de Mineração

Especificamente para as Barragens de Mineração, foi relevante a Portaria nº 526, dez/2013, que estabeleceu a periodicidade de atualização e revisão, a qualificação do responsável técnico, o conteúdo mínimo e o nível de detalhamento do Plano de Ação de Emergência das Barragens de Mineração (PAEBM). Nessa Portaria, foram inicialmente definidos a Zona de Autossalvamento (região a jusante da barragem que se considera não haver tempo suficiente para uma intervenção das autoridades competentes em caso de acidente) e o Estudo de Cenários, que posteriormente foi expresso como Estudo de Inundação, que nada mais é do que o Estudo de Ruptura Hipotética de Barragens, objeto desse artigo.

Uma melhor definição do “Estudo de Inundação” foi trazida na resolução DNPM nº 70.389/2017, como:

“Estudo capaz de caracterizar adequadamente os potenciais impactos, provenientes do processo de inundação em virtude de ruptura ou mau funcionamento da Barragem de Mineração, que deverá ser feito por profissional legalmente habilitado para essa atividade cuja descrição e justificativa deverá, necessariamente, constar no PAEBM (Plano de Ações de Emergência para Barragens de Mineração), sendo de responsabilidade do empreendedor e deste profissional a escolha da melhor metodologia para sua elaboração.”

Em uma breve análise dessa definição, é possível concluir que:

  • O principal objetivo do estudo de ruptura hipotética é caracterizar adequadamente os potenciais impactos originados pela ruptura ou mau funcionamento da barragem. Envolve o conhecimento da área a jusante, a avaliação da população em risco e de muitos impactos que poderiam passar despercebidos sem que um estudo fosse realizado com esse fim. Também deve trazer consigo as particularidades da estrutura e do contexto no qual ela está inserida;
  • É responsabilidade do empreendedor e do profissional que desenvolverá o estudo a escolha da melhor metodologia para sua elaboração. Essa afirmação abre possibilidades para a não uniformidade de estudos de ruptura desenvolvidos por empresas diferentes, com metodologias, critérios e premissas diferentes, gerando como resultado manchas de inundação diferentes. E é sobre essas manchas que os planos emergenciais serão elaborados. É importante notar, que o empreendedor também é responsável pela escolha da metodologia, o que reforça a filosofia do desenvolvimento do trabalho em quatro mãos. De fato, é possível perceber que a colaboração do cliente é fundamental para que o estudo apresente a devida qualidade e responsabilidade.

Legislações de 2020 (resolução ANM nº 32/2020 e Lei nº 14.066/2020)

Somente na resolução ANM nº 32/2020 foram apresentados requisitos técnicos dos estudos de ruptura hipotética, estabelecendo, por exemplo, que:

“O deslocamento da frente de onda a que se refere o § 1º deve ser feito considerando, minimamente, modelos 2D contemplando o acréscimo de materiais e sedimentos que a onda carreará em seu deslocamento, onde o empreendedor deverá executar, minimamente:

  1. A caracterização geotécnica, físico-química e mineralógica dos materiais do reservatório, contemplando, mas não se limitando a, ângulo de repouso, peso específico, granulometria e identificação de superfícies preferenciais de ruptura (…)”

Alguns pontos que podem ser concluídos a partir desses requisitos são:

  • A utilização de modelos hidráulicos 2D, que são capazes de representar de forma mais fidedigna o remanso em tributários, além de serem ideais para aplicação em regiões com topografias planas;
  • Considerar aspectos inerentes ao material sólido armazenado nos reservatórios (rejeitos e/ou sedimentos), como a caracterização física e mineralógica. Tal ponto está intrinsecamente associado às particularidades de cada estrutura, em função do material armazenado e das características reológicas do rejeito e/ou sedimentos;
  • Identificação de superfícies preferenciais de ruptura: mais um aspecto associado à particularidade de cada reservatório, em função, por exemplo, do potencial de liquefação. Ao apresentar o termo de superfícies preferenciais de ruptura, também associa o estudo de ruptura hipotética ao histórico de anomalias observadas e a aspectos geotécnicos que indiquem regiões com maior probabilidade de ruptura por diversos modos de falha, incluindo instabilização frente à ocorrência de eventos sísmicos.

A resolução ANM nº 32/2020 também estabelece prazo para a elaboração de estudos de ruptura hipotética de todas as barragens de mineração, independente do dano potencial associado.

Por fim, uma importante atualização na legislação de barragens foi a promulgação da Lei nº 14.066/2020, que traz a obrigatoriedade de PAE para todas as barragens destinadas à acumulação ou à disposição de rejeitos de mineração, entre muitos outros pontos.

Considerações Finais

A legislação intimamente relacionada aos Estudos de Ruptura Hipotética tem evoluído após os acidentes recentes, juntamente com o surgimento de metodologias e ferramentas mais inovadoras, como modelos hidráulicos bidimensionais e modelos capazes de representar a reologia dos rejeitos.

É importante notar que o maior objetivo desse estudo é caracterizar adequadamente a inundação oriunda da ruptura e, por conseguinte, quantificar e prever com maior assertividade os potenciais impactos associados a esse evento.

Antes mesmo das imposições técnicas da Resolução ANM nº 32/2020, a Pimenta de Ávila já vinha considerando as técnicas mais avançadas no que diz respeito aos estudos de ruptura hipotética, fornecendo soluções adequadas específicas para cada barragem ou Sistema de Disposição de Rejeitos em específico.

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